amor fati
ou quando os caminhos errados te levam para lugares incríveis
acho que algo dentro de mim sempre acreditou que poderia existir um sol para brilhar na minha vida, mesmo com todas as adversidades e os obstáculos que passei, acreditei sempre que essas coisas têm algo para ensinar, e usei as pedras do caminho para construir meu castelo.
demorei algum tempo para perceber que meu império deveria ser feito pelas minhas mãos, e por achar que meus punhos eram fracos demais para erguer torres e fortes, estagnei e aceitei migalhas de diversos tipos.
algumas pareciam pedras boas para minha fundação, mas com o passar do tempo, elas se desfaziam em minhas mãos, como fuligem, cascateando em migalhas, terminando de escoar a poça d'água que eu gostaria de mergulhar.
por um tempo, caminhei no deserto árido em busca de materiais para continuar meu trabalho, afinal, um castelo inteiro não ia se construir sozinho. por entre o caminho, encontrei alguns oásis, no entanto, não eram confortáveis o bastante para se manter por muito tempo.
também delirei e rolei na areia, comendo poeira por um tempo, pensando estar me banhando de águas cristalinas e frescas; ledo engano…
atravessei cidades e continuei meu caminho, me deparando com um litoral inteiro à minha frente, me fazendo pensar em novas possibilidades, e até mesmo navegar por entre um mar inteiro de novas aventuras.
com toda a coragem que me restou, adentrei no mar, e encontrei uma ilha em um determinado momento. foi engraçado, porque eu me senti confortável lá, no entanto, os recursos eram escassos, e logo percebi que ali não poderia ser meu lugar; aquele solo não estava preparado, precisava de cuidados que eu não era mais capaz de dar.
triste em ter que abandonar minha ilha, e com raiva por tudo que houve, e meus machucados profundos causados pelos espinhos de flores que nunca quiseram me agradar de verdade, nadei em mar aberto novamente.
meu corpo ficou à deriva durante um período que não foi grande, contudo, foi doloroso e profundo. algas marinhas prenderam meu pulso, peixes mordiscaram meus calcanhares, e eu não podia fazer nada. era como se eu não pudesse me mexer.
apesar do incômodo, eu sabia que era necessário… eu sabia que precisaria passar por isso, para aprender a não aceitar frutos envenenados pelo meu desespero de ser amada.
encontrei, depois de alguns períodos de desespero, algumas ilhas pequenas para descansar. apesar do conforto de algumas, nenhuma parecia propícia para me instalar.
voltei a navegar, agora em braçadas mais lentas, sem algas para me segurar, apesar das cicatrizes ainda arderem, principalmente em dias de tempestade.
um belo dia, uma ilha belíssima apareceu no meu caminho. suas matas eram sedutoras e convidativas, e eu queria entrar e explorar aquele lugar diferente, mas me contive um pouco, talvez por medo de dar errado novamente, porém, algo intrigante aconteceu…
as marés me levaram cada vez mais para a costa, cada vez mais perto da praia. o céu sempre era azul, o sol sempre brilhava, e os pássaros sempre estavam em harmonia. era impossível não querer explorar aquele lugar…
e pela primeira vez, vi que teria companhia de verdade; ao olhar por cima do ombro ao desembarcar na praia, vi uma mulher… ou seria o sol? ela brilhava tanto, era difícil saber de onde vinha aquele brilho todo, personificado em uma só pessoa.
aos poucos me rendi, explorei a ilha com ela, deixei com que ela me explorasse também. ela disse que caminhou muito para chegar até aquele lugar também. sem nenhum esforço, suas mãos acolheram minhas cicatrizes, tomando para si meu coração remendado. com cuidado ela fechou as feridas, enxugou minhas lágrimas e me permitiu fazer-lhe o mesmo.
talvez, se o destino não tivesse me ensinado tanto com minhas escolhas desastradas, eu não saberia dar valor à imensidão que se posta na minha frente, que fica palpável aos olhos quando encaro os olhos esverdeados mais lindos que já vi na vida.
para rafaellas
com todo o amor do mundo;gabirelas